A confidencialidade é essencial nas relações interpessoais. Os temas tratados em particular, ainda que os interlocutores sejam pessoas públicas, exigem resguardo e mútuo respeito.
Revelar, ainda que a órgãos de Estado, conversa particular, sem autorização dos emitentes das opiniões, fere os mínimos princípios éticos da boa convivência.
Um diplomata deve informar seu país a respeito de temas relevantes, mas não pode se ater a pequenas fofocas próprias de um bar em pleno sábado pela madrugada.
A revelação dos informes recebidos pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, de todas as partes do mundo, demonstra uma inusitada vontade de praticar bisbilhotice.
Pouco importa saber sobre os traços psicológicos de um governante. É necessário saber suas intenções sobre o futuro das relações entre dois Estados independentes, um deles os Estados Unidos, no caso.
Estas divagações surgem com a leitura das informações reveladas pelo blog Wikileaks. Mais de duzentas e cinqüenta mil registros formulados pela diplomacia americana foram desvendados.
O episódio possui inúmeras facetas. Leva a desconfiança a qualquer contato com autoridade dos Estados Unidos. A boa e sadia relação entre estados nacionais se rompe. Não há espaço para confiança, tão salutar nas relações humanas, quando a bisbilhotice está presente.
Poderá parecer ingênua esta afirmação, principalmente quando se conhece traços da história da diplomacia. Esta sempre foi envolvida por espiões - mulheres e homens - que buscavam saber as entranhas dos países.
Normal no decorrer dos séculos XIX e parte do século XX. Faltam comunicações e regimes autoritários - como o nazismo e o comunismo - impediam a livre circulação de notícias.
Hoje, com a liberdade dos meios de comunicação existente nos principais países torna-se desnecessária a bisbilhotice. Tudo se sabe e tudo é escancarado. Basta assinar jornais espalhados por toda a parte.
O episódio gerado pelo jornalista australiano Julian Assange, que contou, em sua elaboração, com a contribuição do soldado Bradley Maning, revela a fragilidade dos sistemas de informação dos Estados Unidos.
É frágil a estrutura de poder dos americanos. Nela qualquer pessoa pode penetrar e ingressar nos assuntos de Estado. Sabe-se agora com nitidez como são vistos os governantes estrangeiros pelo sistema norte-americano.
O australiano Assange produziu um estrago irremediável - a curto prazo - na diplomacia dos Estados Unidos. Receber um diplomata americano, a partir de agora, será exercício de obsequioso silêncio.
A par desta constatação, recolhe-se no acontecimento outra conseqüência. A força e o imediatismo da internet. Este instrumento não permite qualquer cerceamento na divulgação das notícias.
A notícia elaborada lança-se imediatamente por toda a parte. Não há bloqueios possíveis antes da divulgação da notícia, ainda porque a elaboração e emissão cabem - muitas vezes - a uma só pessoa.
A internet veio para ficar. Ela não substituirá a média impressa por inteiro, mas certamente a cada dia terá maior presença na sociedade. Esta conclusão é fácil de ser constada.
Uma matéria na internet produz centenas ou milhares de referências dos internautas. Apareceu na internet verifica-se imediata repercussão. Enquanto isto, nos jornais clássicos as cartas dos leitores contam-se às dezenas, na melhor das hipóteses.
Isto quer dizer que a internet é um instrumento democrático eficiente e único? É verdade. Mas, como nada é perfeito, a internet conta com um anonimato que fragiliza os posicionamentos.
O internauta pode se manter anônima. Este fato leva a posicionamentos agressivos e, por vezes, ofensivos. O pensamento - para ser legítimo - precisa contar com autoria expressa.
A Roupa Nova do Rei, ou melhor, The Emperor's New Clothes
É uma ingenuidade sem tamanho achar que a diplomacia estadunidense respeita os "bons costumes" da diplomacia internacional informando seu país APENAS a respeito de temas relevantes.
Que os EUA bisbilhotam os outros sempre se soube. Ou alguém aí acha que a internet, seus emails, perfis em Facebook, Orkut e similares são sigilosos ? Você que usa gmail, yahoo mail, hotmail ou qualquer outro pense : qual é o mais seguro e sigiloso ?
Não perca seu tempo achando que suas opiniões são anônimas e seguras. O pentágono e o Departamento de Estado dos EUA possuem máquinas que vasculham a internet comandadas por algoritmos. Mas não se iluda, outros países também o fazem. Não vamos novamente bancar os ingênuos e achar que a China, a Inglaterra, a Rússia ficam parados feito poste.
Este episódio do Wikileaks será de grande validade para a humanidade se ajudar a diminuir essa monumental hipocrisia das relações entre países que não mudou muito dos últimos 5.000 anos; ou seja, uns querendo dominar/controlar, outros. Foi assim no Império Romano - que não tinha internet - e é assim hoje.
Até parece que todos são amigos. Não, ninguém é amigo de ninguém. Não existem relações sadias entre países. Existem relações doentes, relações de domínio, relações de império.
E essa história de que somos todos iguais é pura ilusão. Como 2 países podem ser iguais se um tem 10.000 ogivas nucleares e o outro não tem nenhuma ?
O Wikileaks presta um grande serviço ao colocar às claras a hipocrisia, não apenas a dos EUA nas suas relações imperiais que todos já conhecemos, mas a dos outros países que fingiam não ver para parecerem inteligentes tal como no conto de Hans Christian Andersen.
Julian Assange é o menino que grita : O Rei está nú !
+ info :
. . . A Roupa Nova do Rei : Wikipedia em português
. . The Emperor's New clothes : Wikipedia em inglês
Nenhum comentário:
Postar um comentário